
Enquanto o Lou Reed canta que não sabe para onde vai, eu concordo mentalmente. Desculpe-me o pessimismo, mas acho que todos nós não sabemos.
Tenho sentido falta daquele otimismo, que pairava sobre nós. Daquele utopia que era pauta naquele bar mais sujo da cidade. A cerveja era sempre a mais barata, porque nossas ressacas não tinham 20 e tantos anos e nós ríamos daqueles casais que dançavam ao som da jukebox, semi bêbados, com cerca de 60 anos cada, eles eram felizes.
Nem que seja com 60,70 ou 80, mas que nós possamos readquirir o otimismo e nos embalar ao som da jukebox que ecoa Amado Batista e que nos faz rir e sorrir.

Sobre a confusão do teu sorriso
Eu conheci o sorriso mais lindo do mundo. Ele vinha em pequenas doses, quando falávamos sobre piadas sem graça ou quando o álcool deixava falar o que vem da alma. Quanto mais o tempo passava maior se tornava o sorriso que eu acordaria ao lado todos os dias sem algum problema.
Contraposto ao meu rosto, deslizavam os lábios que faziam parte daquele cenário de dentes impecavelmente alinhados e brancos, brancos como as nuvens que dançavam no céu daquela tarde.
Setembro, sol, fumaça, teu cachecol e os meus dedos deslizavam por cachos castanhos/douarados responsáveis pelo perfume da minha blusa na manhã seguinte.
O temporal que agora se prepara lá fora não faz menos barulho nem menos bagunça que aquele sábado abafado provocou na minha mente. Tuas histórias e devaneios foram responsáveis por minhas epifanias e a causa dos meus ansiolíticos, enquanto tuas pernas e mãos sobre meu quadril, a causa dos arrepios na minha pele e do meu sorriso espontâneo.
Mas ainda me resta o teu sorriso, na minha memória ainda há o teu sorriso.

quem falou demais?
quem queimou o filme?
quem esqueceu?
os demônios que habitam a tua mente,
estão na minha também
O novo dia que clareira enquanto tu só pensa em ir pra casa
te mostra que o lar te conforta
Um banho pra acordar, duas pílulas pra dormir
e a tentativa de encobrir as paranóias da noite passada
Exteriorizar teus conflitos internos através da arte talvez seja o caminho,
menos dolorido e com menos efeitos colaterais
Não esquece que um novo dia virá, e outras noites também
Virão cheias daquilo que te anestesia, que enche teu ego e tua alma de alegria
Exterioriza tua paranóia
Musicaliza, escreve, pinta, ou tenta conseguir outra receita
Só não esquece que o novo dia vai brilhar e pra um novo mundo tu pode sempre sorrir

Busca
Vivemos na geraçaõ da busca. Buscamos desenfreadamente, noite após noite, mal sabemos o que. Coisas mascaradas em copos de bebidas, utopias travestidas em beijos em banheiros de um bar qualquer. Alcançamos transcendência e satisfação através da arte, música para libertar, literatura para viajar e fotografia para eternizar mnomentos, que deixam na boca um gosto amargo na manhã seguinte. Nos falta tato, falta profundeza nas pessoas tão rasas que andam pra lá e pra cá desfilando pernas quentes pelos bares da cidade. Segunda após segunda, ano após ano fazendo promessas furadas e procurando a estabilidade que talvez nunca alcançaremos, porque no fundo é isso que nos move.

Me senti mais perdida do que os filhos de puta em apresentações escolares, mais confusa do que o indivíduo que só tem gêmeos e libra no mapa astral. Enquanto a espuma da cerveja desce, o copo molha a mesa e o líquido esquenta, nós seguimos com utopias e ideologias furadas que nos fazem perder a hora do trabalho no dia seguinte. Precisando da atenção de um, do sexo incomparável de outros e de ninguém naqueles dias de fossa que só a música alimenta a alma, seguimos em frente.
O grande caos que há lá fora e dentro de nós durante a sobriedade dos dias úteis é anestesiado pela poesia que nos faz ver beleza em tudo e vem pra suprir o vazio que nos acomete nos finais de mês e nas tardes frias dos domingos de julho.
Precisando da força de um, e do carinho de outros, queremos gritar para o mundo o quanto os tapas durante o sexo são importantes e o quanto esperamos mensagens de bom dia e cafuné na manhã seguinte.
Embora satisfeitos, seguimos confusos, dando impulso a nossas vidas, apaixonando-se toda semana e quebrando a cara a cada dia.
Be Love
o amor vem andando sobre pernas longas
trajando calças skinny, com um cigarro na boca
vem caminhando com sorriso farto
mente turbulenta e diálogos hiperativos
está presente na espuma da cerveja barata
daquele copo engordurado, no buteco mais barato da cidade
fixado nas calmarias da cama nas tardes de domingo
é o bom dia ao porteiro, e a gentileza à balconista da padaria,
que valoriza mais seus bons modos do que a gorjeta do engravatado, que mal levanta os olhos enquanto toma um expresso, lê o jornal e verifica o e-mail
amor é a intensidade do sexo casual e a alteração de status no facebook
é o frio na barriga do primeiro encontro e a intimidade adquirda nos seis anos que os pijamas viram camisetas e calcinhas de algodão
ele está ali, nas oito horas de trabalho que não só alimentam o fervoroso capitalismo, mas também a ideologia incorporada desde o dia do vestibular
é também ver seis vezes o mesmo filme achando novos detalhes, e se arrepiar com a trilha sonora
é sexo masoquista, cafuné e crises de ciúmes mascaradas de orgulho
é o não voltar pra casa, virar noites e se acalentar com o cachorro em doze horas de sono
em tempos de fúria, seja amor.

like a on the road
foge comigo?
virando noites, morrendo de rir
ouvindo Pet Sounds
enquanto eu me acomodo sobre tuas coxas
meu lugar preferido no mundo
enquanto tu comenta sobre a genialidade do Brian Wilson
esquece a vida lá fora
encontra comigo o equilíbrio que buscamos
não leva a vida tão a sério
e continua sendo minha inspiração
façamos o jogo da procrastinação
e nos concentremos apenas no som que sai do rádio
e nos ruídos da estrada
surf in U.S.A enquanto a gente ri
das praias do bizarro litoral gaúcho
eternizemos esse momento fazendo fotos etílicas
motivos de risadas dos dias seguintes
teu medo e teu pessimismo me questionam
com olhos de aflição
e se não der certo?
-baby, hoje também não deu.
foge comigo.
Se
Se não fosse a forma como o George canta
Se não fosse a chuva que cai lá fora e a forma louca e desenfreada que o tempo passa
Se não fosse as noites passadas em claro
As mesas de bar, as palavras não ditas e o que não deveríamos expressar
O rivotril pra dormir e o banho pra acordar
Se não fosse a saudade do início onde tudo era bonito, como tudo na vida
Não fosse minha ansiedade e teu orgulho e as minhas paranóias
E a voz do Serge em meus ouvidos
Se não fosse a crise do país
A rinite, a sinusite e os desabrigados no Haiti
A Dilma, o Cunha e o Temer (fora!)
Se não fosse o tesão
A sede pelo inalcançável
E o Scott Fitzgerald de consolo,
Talvez eu não estaria aqui
E se não fosse assim, meio torto
-psicótico, neurótico, todo errado-
Não seria eu

ata-me
entre o nascer e o morrer,
eis a vida
efêmera, encantadora, que escorre pelos dedos.
perturbação como zona de conforto
dor como forma de prazer
fossa como fonte de arte
amor para dar cor
tesão para viver
tesão em tudo
tesão em falar, tesão em viver, tesão em trabalhar
tesão em foder.
vida é tesão, é incerteza
é transcender se pelos pequenos prazeres,
é ter prazer, dando prazer.
somos irracionais, somos passionais
medimos nossa sanidade pela umidade que escorre pelas coxas
quanto mais molhado, menos racional
quanto mais molhado, melhor.
somos sádicos
queremos o inalcançável, o que não temos
somos burros.
achamos prazer no sadismo
físico e psicológico
mesmo que involuntariamente.

musicalize-se
A música vem da alma, e toca a alma. Grave, estridente, emocionalmente cativante, fazendo os pêlos dos braços se elevarem.
A rouquidão de Bob Dylan, a frustração de Belchior conectam ao mais profundo e intrínseco universo particular. Melodias que ecoam madrugada a dentro, do velho toca discos chiado ou pelo moderno mp3 através dos fones.
O barulho da chuva, o roçar de pernas, gemidos, o agudo desafinado do John, tudo é som, tudo é transcendência.
Música é libertação, mental e atemporal. É terapêutico, excitante e acalentador.
Felizes aqueles que não ouvem sons, mas que os sentem, que os respiram, transpiram e absorvem. Absorvem riffs, solos e letras.
Música é deixar transbordar na alma, refletida no arrepio da epiderme, o que a vida é, sua glória, sua podridão, amores confortantes, paixões arrebatadoras e fossas de partir o coração e encher os copos.

Blonde on Blonde
O amor é Beatle, a paixão é uma paulada Stoneana, ele tem me deixado bem Dylan Com discursos complexos e indiferença a flor da pele, ele mantém a subjetividade na ponta da língua a todo momento. Entre doses de um licor barato vendido por whisky ele fuma com a boca, traga com a mente e expele fumaça com os olhos Olhos distantes e gigantes que fitam o nada Como em Blonde on Blonde ele me carrega pra uma levada rock n roll de tesão, e pequenas farras. E nos dias de ressaca, a melancolia do folk soa Just Like a Woman e eu sinto sua falta
Sooner or later, one of us must know That I really did try to get close to you

Não quero estar aqui
Elas enchem as filas do banheiro, a primeira fileira em frente ao palco e dançam freneticamente enquanto observam os olhos que as cercam. Retocam batons marcantes enquanto verificam o celular, sentadas numa mesa sozinhas, tiram fotos que transpareçam toda a felicidade que não existe ali, mas precisam provar para o mundo e para o ego os lugares badalados onde estiveram.
Variam a faixa etária, e também o sexo. Todos parecem buscar algo que não está ali, enquanto pedem mais uma para o garçom.Mãos e corpos ululantes cantarolam junto à banda que insiste em tocar os mesmos covers batidos. As faixas que embalam coros são as mesmas que subjetivamente transparecem lembranças e frustrações em uma só voz.A bebida tenta anestesiar a apreensão que mostra que a noite está passando e nada está acontecendo, enquanto começam a reunir dinheiro entre eles para pedirem a próxima rodada.Enquanto alguns espontaneamente felizes se divertem a maioria se anestesia de álcool, fumaça e flertes mal correspondidos, enquanto olham o celular esperando a mensagem que nunca chegou.
Carentes de afeto e demonstrações claras de carinho, eles vivem a chamada cultura do desinteresse. Corações calejados e incertezas sobre aceitações alimentam uma rotina de medos e palavras não ditas. Externamente são seguros de si e autossuficientes, por dentro, clamam por um minuto que envolva bem mais que sexo. Almejam trocas mútuas, de interesses, de carinho e de tardes andando pelo parque discutindo sobre discos e planejando a próxima viagem.
Após a segunda gim tônica, esforçam-se para não demonstrar o quanto estão se deleitando naquele momento e o quanto afagar os cabelos dele agora seria agradável, mas vivendo num mar de inseguranças eles não demonstram, enquanto a outra parte alimenta falsos afetos em troca de uma noite fazendo com que a confusão mental da geração da cultura do desinteresse intrínsicamente cresça a cada dia.

efervescente calmaria
enquanto mil guerras acontecem
enquanto eles disseminam ódio
enquanto grosseria é usada como defesa
temos nossa nova Paris
nova atmosfera
do mundo literário, do nosso mundo
da nossa incrível utopia
do nosso incrível dom de ver otimismo nas coisas mais desgraçadas
enquanto houver amor
e a minha roupa com teu cheiro
enquanto contamos rindo de nós mesmos
o quanto somos posssessivos e românticos
e o quanto nossa cama é curta
e nossos corações são largos,
sempre haverá a nossa Paris.

sexta-feira
Há tempos não tinha momentos de calma e clareza de pensamentos. A vida corrida, campanhas eleitorais, o acúmulo dos boletos, a gastrite, a rinite, a instabilidade emocional. Nada disso colabora para um momento de calma, mas ele apareceu.
Apareceu em meio a uma ensolarada tarde de sexta, daquelas boas de observar a rua pela sacada enquanto o cigarro queima, o café esfria e o Ray Davies canta. Ela não antecedia um final de semana com grandes expectativas. Nada de anormal, trabalha, sai, bebe, fode, dorme, acorda, repete o processo e chega na segunda.
O que há de mais mágico em um sexta-feira é pensar que ela não é uma sexta-feira.
Não espere o sexto dia da semana para ser feliz, o ser feliz é agora - me desculpem o clichê-. Mas não se submeta a um trabalho, relacionamento ou círculo social que faça você clamar por dois míseros dias no final da semana.
A beleza e o prazer das coisas simples estão para ser vividos 24 horas, 30 ou 31 dias em um mês.
Sorrir é de graça, a música é de graça e para contemplar as pequenas coisas da vida não custa um centavo. Abraços, beijos, sexo, pequenas gentilezas para desconhecidos, comer aquilo que lhe satisfaz ou botar a playlist no aleatório e comemorar quando chega a música favorita também não custa nada, mas por favor -NÃO ESPERE A PRÓXIMA SEXTA-FEIRA- para fazer tudo isso.

Nada de anormal das demais manhãs. Um comprimido, dois goles d'água, vai ao banheiro, café, cigarro. Toca a playlist batida enquanto a água do chuveiro escorre pelo corpo e pelo box. Tenta tirar com água e sabão a podridão da noite passada. Fumaça, bebida, mãos e bocas que passaram pelo corpo que tenta anestesiar a mente de mais uma peça que a vida insiste em pregar.

Utopia Dylanesca
ele me falou das incertezas
e do quanto havia vivacidade
na minha alma
-Highway 61 revisited na vitrola-
nunca lidei bem com as dúvidas
e sempre houve vivacidade
quem vive demais, sente demais
e se colide com pessoas rasas
Dylan canta -Ballad of thin man-
a música mais linda e agoniante do velho vinil
garimpado no parque, nas manhãs de domingo
ele cantarola
e com olhos tão escuros como a noite
traga o cigarro e instiga
-Do you, Mr. Jones?-
cinco minutos
cinquenta e seis segundos
de agonia sedutora
Dylan também vive de incertezas
todos nós vivemos, concluo
-Because somehting is happening here-
e eu queria ter uma mente segura e linear
entretanto
se a minha vivacidade depende da incerteza dos instigantes olhos negros
viveremos de e com incertezas até o fim de nossas vidas
enquanto Dylan suaviza as coisas com -Queen Jane Approximately-

Contemplação
Leminski disse que o amor é uma matéria-prima que a vida se encarrega em transformar em raiva ou rima. Salve todos os poetas que conseguem externizar toda a angústia, todos os casos mal resolvidos e suas ressacas morais através das letras.
É do jogo, tudo que começa um dia está fadado a acabar. Relacionamentos, interesses. Até o tesão acaba.
Alguém vai se machucar, e isso também é do jogo.
Porres homéricos e sexo com amigos como válvula de escape amortecem e transparecem a imagem que tudo está bem como se ele fosse a pessoa mais compreensiva e desapegada na face da terra, mas não está, e ele não é.
Se pelo menos mais uma vez pudesse sentir ela entre seus braços como faziam na hora de dormir, se pelo menos mais uma vez pudesse ter o controle de seus quadris entre suas coxas em movimentos ritmados e profundos.
Sobre todas as fantasias que ele cria a que mais incomoda é a de pensar nela rebolando seus quadris sob outros corpos.
A possessividade é do ser humano, temos instinto primata, queremos proteger, queremos pra nós.
Nunca foi um defensor da monogamia ferrenha, mas a possessividade lhe tomava conta quando pensava o quanto ela era livre, e o quanto conseguia lhe dar todo o afeto e proteção que ele tanto queria e camuflava através de piadas e jogos de insinuações.
Em seus momentos mais introspectivos e românticos pensava o quanto ela podia o desejar também, e o quanto o jogo do desinteresse é responsável por afastar as pessoas.
É do jogo, alguém vai se machucar, e dessa vez ele foi contemplado.

Something
Restou apenas o cheiro dela nos seus cabelos. Cabelos espalhados pela cama onde riram e fizeram confissões nas entrelinhas.
Ela chegou e se foi - Free as a bird -.
Após inúmeras noites, tardes e finais de semana - You've Got to Hide Your Love Away - pensavam.
Palavras que não foram ditas, besteiras que foram faladas como forma de proteção ou insegurança.
Brincadeiras, ingênuas pornografias, beijos longos e suaves - Don't Let me Down - ele suplicava em pensamentos.
Conversas intermináveis, cantorias desafinadas e fantasias no sense trancafiadas num quarto e em um jardim abafado - While My Guitar Gently Weeps -.
O bar que ela mais gostava, o jeito que se comunicava com os olhos arregalados enquanto ele sério confessava pra si mesmo - i'm just Jealous Guy -.
Planos, vamos cruzar a fronteira?, quem sabe viver em - Submarino Amarelo -, abrir mão do capitalismo e da realidade assombrosa que sobrevive da porta pra fora do pequeno apartamento.
Vivendo em um eterno bed peace de 48h, a realidade dos dias úteis não colaborava para o afeto que não suportou as inseguranças e faltas de comunicação dos dias corridos.
Ela se foi - Free as a bird - enquanto ambos pensam - I'm only sleeping - e quando acordar quero desbravar lugares, e não soltar sua mão - Across the universe-.

É Primavera!
Ainda bem que temos a primavera. Apesar de todos os clichês, é indiscutível dizer que os dias mais ensolarados nos remetem a um clima mais agradável.
Seja pela cervejinha no final da tarde, pelas coxas de fora que circulam pelas travessas ou pelos rostos suados e felizes pós abraços e beijos calorosos.
Dias cinzas são introspectivos, três dias de chuva consecutivos liberam melancolia até no mais racional dos seres humanos.
Veja, há vida lá fora. Pássaros cantando, flores desabrochando.
Apesar de todo lirismo, o ser humano precisa renovar, florescer, fechar ciclos para águas novas entrarem no quintal.
Transgressa, floreie se, se colora, e faça da mente casa de bons pensamentos.

Ande descalço, ripongueie e deixe a música e o sol tomarem conta. No inverno também deve ser assim, entretanto a partir de setembro é mais fácil pôr em prática o bom humor e o tesão que ficaram adormecidos de junho a agosto.
Escabele-se, vá a praia, acampe, perca noites de sono, acorde às 6h de bom humor com o sol entre as cortinas.
Abrace, viaje, incorpore o beatnik que ficou camuflado durante os meses de frio e permita-se!

das probabilidades
talvez seja a bebida
o comodismo
ou a falta de afeto
talvez seja minha impaciência
e inconstância
a cabeça avoada
e os versos de Beast of Burden
talvez seja o grave da Nico,
os meus repetidos setlists
ou ainda a sensualidade e melancolia de Blueberry Hill
talvez seja o mapa astral
ou o aquecimento global
ou talvez - e mais provável -
que não seja nada.
até quando?

até quando, João?
depois que a palavra arrependimento foi criada
o número de canalhas foi só crescendo.
uma série de blá, blá e blás e desculpas esfarrapadas
permeiam as manhãs de sábado e domingo
- não esqueça de mantê-las ao longo da semana-
desencontros de informações podem ser fatais.
você tem tido noites ótimas, manhãs difíceis,
as tardes te lembram cold turkey, até o sol sair
e o seu ritual recomeçar.
eu vejo corpos dançandos, eles se encostam
roupas espalhafatosas, calças cintilantes e testas suadas
você tenta se controlar, João
percebo que sim
até ela chegar...
mas esse seu esforço barato não dura meia hora
testas suadas
calças cintilantes
ligações
manhãs funebres
"cold turkey, hasd got me
on the run"
até quando, João?
A força da mulher do fim do mundo

Temos necessidade, imposta pelo mundo moderno, de assistir, ouvir e comentar assuntos em uma instantaneidade desenfreada. Elza Soares lançou em 2015 o aclamado A Mulher do Fim do Mundo. Até o presente momento não tinha escutado, confesso, mas depois da ação ocorrida arrependimento não há.
Com mais de 30 discos lançados em 60 anos de carreira, a eterna musa de Garrincha vai do samba, ao eletro, com soul e letras de protesto com uma pincelada de rock n'roll em seu último trabalho.
Encabeçada pelo feminismo, Maria da Vila Matilde, a segunda faixa do álbum convida mulheres a denunciarem seus parceiros pelos abusos sofridos e garante "Cê vai se arrepender de levantar a mão pra mim". Elza vai ao encontro dos inúmeros movimentos que fazem mulheres se libertarem de relacionamentos abusivos, seja por meio de redes sociais, disque denúncia ou presencialmente. O público feminino ganha força e destaque durante todo o álbum.
Em faixas como Pra fuder pode se perceber que a Elza movida pela paixão ainda arde no peito da cantora, que embora não tenho composto todas as faixas do disco e preferese apresentar sentada nos seus shows, bota pra fora tudo que já passou pela vida, altos e baixos, excessos, preconceitos, com uma sensação de alívio e de convite para que todos façam igual.
Indignada, talvez, a artista mostrase com uma visão de mundo entre o realismo e o pessimismo. Canta aos quatro ventos "Bem que o anão me contou que o mundo vai terminar num poço cheio de merda", mas não se dá por vencida quando entoa "Eu quero cantar, me deixem cantar até o fim".
Cante Elza, cante até o fim, por no mínimo mais 60 anos, para que aqueles, que assim como eu, possam, mesmo que atrasados, ter o deleite de ouvir seu último disco e presenciar a força e o talento da mulher do fim do mundo.
Para acompanhar a agenda de shows e lançamentos de Elza Soares, acesse seu Facebook (https://www.facebook.com/elzasoaresoficial/?fref=ts).
Confira o álbum completo:
https://www.youtube.com/watch?v=iXyXbyEW2YA
Por um sopro de brasilidade
Milhares de hashtags, tweets e posts foram disparados na noite do último domingo alusivos à cerimônia de encerramento das Olimpíadas. Grande parte deles exaltando o swing, a alegria e principalmente a música brasileira.
Muito bonito todo o patriotismo e a exaltação das raízes, se não fosse o esquecimento disso tudo nos outros 364 dias do ano.

O brasileiro tem disso - tudo que vem de fora é melhor. Desde o boom do rock n' roll nos saudosos anos 60, a música tupiniquim decidiu tomar molde pelo british rock e por aí afora.
Desde franjas beatle a cópias de girls group nos anos 90, o brasileiro vai seguindo as coqueluches.
Não sejamos céticos, a música brasileira é de uma riqueza e originalidade indiscutível. Temos Mutantes, Cartola, Caetano, Belchior, Cazuza e Elza Soares que não me deixam mentir.
Cabe a nós enaltecer e valorizar a cultura local.

Mas nem só de grandes nomes, conhecidos há várias gerações, vive a música brasileira. Na cena atual, há um leque muito bem recheado e com estilo para todos os gostos.
Plataformas digitais e serviços de streaming disponibilizam os álbuns completos dessa galera que vem dar sangue novo, e de qualidade, na música tupiniquim.
Dê o play e deleite-se na brasilidade!
Bárbara Eugênia - Lançou o delicioso Frou Frou no ano passado. Com uma pegada de psicodelia, o pop eletrônico passa por baladinhas e canções folk. Para os mais saudosistas, Bárbara fez uma versão de Por que Brigamos da Diana - sim, aquela dos anos 70 - que rendeu até dueto com a própria cantora.
Ouça Frou Frou na íntegra:
https://www.youtube.com/watch?v=Br5Qiy10JxE
Alice Caymmi - Neta de Dorival Caymmi, a partir daí só podemos esperar ótimas sonoridades. Como típica filha de Iansã, Alice é ventania por onde passa. De Rolling Stones a Mc Marcinho, as apresentações da moça são dotadas de personalidade, figurinos elaborados e tesão pela música. A voz da pequena Caymmi dispensa comentários...
Ouça a versão de Iansã de Gil e Caetano na versão de Alice Caymmi:
https://www.youtube.com/watch?v=pq40Tgq9USY
Cachorro Grande - Para os amantes do bom e velho e rock n' roll, acabou de lançar o ElectroMod. Com a pegada eletrônica que a banda vem seguindo desde 2014, a banda transita por letras pesadas, distorções típicas, com direito a macacões mod à la The Who nas apresentações.
Confira o som que dá nome ao álbum:
https://www.youtube.com/watch?v=MocqiP6wjdw
Para não dizer que não falamos dos clássicos, escuta Vampiro do Jorge Mautner na conhecida versão do Caê!
https://www.youtube.com/watch?v=viDfQZdpoE8

Nota de úmidos rodapés
chuva, calor, umidade.
tão úmido quanto o quarto da casa que ele se orgulha - é igual Clube da Luta -
cheiros impregnados,
noites mal dormidas, flashbacks de frases, demonstrações tímidas
de afeto, tão bêbadas e cínicas quanto nós.
Tenha uma música matinal
Você tem uma música matinal? A pergunta pode parecer meio absurda, mas você tem? Quem é movido por música, deve entender do que estou falando.
A música move as pessoas, o mundo, as emoções. Desde 1950 quando Chuck Berry revolucionou o mundo em três acordes, quadris se movem involuntariamente ao soar do primeiro riff.
Desde que dois caras de cabelos new wave cantaram É o Amor em 1991, sua mãe, tias e avós se embalam apaixonadas nas reuniões de família, junto com aquela parte dos parentes oriunda dos anos 80, que ainda suspira cantando It must have been love do Roxette.
Para um dia de fossa, você vai ouvir um blues do Mississipi e se sentir melhor, mais por dentro da melancolia, mas melhor. Para aquela época em que você tem um novo amor e enxerga beleza até onde não existe, provavelmente você cantarolará I want hold your hand dos Beatles sem se sentir brega ou tolo.
E para aquele momento em que você está andando pela rua, ouvindo buzinas, senhoras gritando ao falar no celular, choro de criança dentro do ônibus, mas queria mesmo era estar dormindo, também recomenda-se música.
Indica-se aquela melodia que te faz acordar de verdade, aquela que te faz ter uma visão otimista do dia que se tem pela frente, aquela que quando você notar, já estará cantando junto e dando adeus para o típico mau humor matinal.

Há umas três semanas, eu escuto Cidade dos Normais toda as manhãs. O celular até pode entrar em modo aleatório mas essa da Escambau, banda Curitibana do Giovanni Caruso da extinta Faichecleres, é mais necessária do que a dose de cafeína matutina.
O ritual pode parecer bizarro, digno de portador de TOC, mas os efeitos são sensacionais, garanto, afinal além da música o que move as pessoas e o mundo é a alegria e o bom humor.
Para ter uma manhã bacana escute Cidade dos Normais:
https://www.youtube.com/watch?v=pzjwMjreCr8
Para acordar dançando:
https://www.youtube.com/watch?v=U16Xg_rQZkA
